Pantanal de Mato Grosso do Sul, na Bacia do Rio Taquari, em região próxima às fazendas que são alvo de ações movidas pelo MPMS – ARQUIVO/CORREIO DO ESTADO
Depois de tramitarem quase seis anos em ritmo moroso no Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS), as ações civis públicas e os pedidos para anulação de licenças ambientais ajuizados pelo MPMS contra licenças concedidas às fazendas Santa Mônica e São Sebastião voltaram a tramitar com mais rapidez neste ano no Estado.
A primeira ação se refere à Fazenda Santa Mônica, propriedade de 24 mil hectares, cuja licença para suprimir 20.000 ha de vegetação nativa, concedida pelo Imasul em 2016, foi alvo da primeira ação civil pública movida pelo MPMS que questionou o Decreto nº 14.273/2015. A fazenda, que pertence ao fazendeiro de Maracaju Elvio Rodrigues e sua esposa, Sonia Oliveira Rodrigues, “estreou” a série de ações contra as licenças concedidas pelo Imasul para o desmate do Pantanal na Justiça.
A outra licença, para a supressão de 20 mil ha de mata nativa foi concedida para a Fazenda São Sebastião, também no Pantanal de Corumbá. A propriedade é da Majora Participações, empresa com sede em São Paulo e que pertence a uma outra série de empresas e investidores.
O título de propriedade da fazenda, inclusive, destoa bastante da cultura do homem pantaneiro, que vem sendo bastante invocada nos debates para se criar uma nova Lei do Pantanal. A Majora Participações, dona da Fazenda São Sebastião, recebeu licença para suprimir 10 mil hectares de mata nativa.
Decreto
O decreto de 2015, do ex-governador Reinaldo Azambuja (PSDB), é acusado de fazer com que o desmatamento no Pantanal de Mato Grosso do Sul disparasse, sob a justificativa de supressão vegetal para “reforma de pastagens”, tudo com licença concedida pelo Imasul. Os efeitos desse decreto foram suspensos parcialmente por Eduardo Riedel (PSDB), atual governador do Estado.
O Decreto nº 14.273/2015 foi o grande fiador para o desmatamento que ocorreu nas duas fazendas, cujas licenças foram anuladas em primeira instância pela juíza de Corumbá Luiza Vieira Sá de Figueiredo.
Em 24 de setembro de 2020, a magistrada anulou a licença concedida pelo Imasul por entender que ela afrontava a Constituição (que determina que o Pantanal é um patrimônio natural e deve ser protegido), resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) e até mesmo a Lei Estadual de Zoneamento Econômico-Ecológico. A defesa e o Imasul, que apelou da decisão, alegam que as licenças atendem ao decreto de 2015 de Azambuja.
Além de anular a licença, a magistrada ainda determinou uma reparação de dano ambiental de R$ 50 por hectare desmatado. Se Élvio e esposa desmataram os 20 mil ha a que estavam autorizados, a indenização poderá passar de R$ 1 milhão. Além disso, foram condenados a apresentar um Projeto de Recuperação de Áreas Degradadas (Prade) em um período de 90 dias, sob pena de multa diária de R$ 1 mil.
Pouco mais de dois anos depois, foi a vez de a Majora Participações ser alvo de condenação quase idêntica. A licença concedida pelo Imasul com base no decreto de 2015 foi considerada nula, a indenização foi de R$ 50 por hectare desmatado e também foi incumbida a elaboração de um Prade.
Atualmente, os processos se encontram em segunda instância, aguardando o julgamento dos recursos de apelação de sentença. No recurso da Fazenda Santa Mônica, mais adiantado, o fazendeiro de Maracaju Élvio Rodrigues, que é defendido pelo advogado Gustavo Passarelli, e a Procuradoria-Geral do Estado, defensora do Imasul, tiveram seus pedidos preliminares negados pelo relator, que deve encaminhar o julgamento para os próximos dias.
No processo da Fazenda São Sebastião, a ação civil pública correu à revelia da Majora Participações. Mas a empresa nem precisou se preocupar em fazer sua defesa: a Procuradoria-Geral do Estado, órgão do Poder Executivo, encarregou-se de apelar da decisão e defender a licença para suprimir 10 mil hectares no Pantanal.
Pedido do governador
Todas as liminares concedidas na primeira e na segunda instância para suspender a supressão vegetal nestas fazendas, desde que os processos foram ajuizados no fim da década passada, foram em vão. No fim da década passada, depois de derrotas seguidas sofridas pelo Imasul na primeira e na segunda instância, o ex-governador Reinaldo Azambuja fez uso de uma ação muito rara, endereçada diretamente ao presidente do TJMS, para suspender o efeito das decisões de juízes e desembargadores que proibiam o desmate nas fazendas: o pedido de suspensão de liminar (PSL).
O PSL, ação que só é usada quando o interesse público está gravemente ameaçado, em caso de greves ou de possíveis graves perdas financeiras, acabou sendo eficaz nos pedidos de Azambuja em favor de Élvio Rodrigues e da Majora Participações: as liminares estão suspensas até o trânsito em julgado das ações originárias, e os proprietários podem suprimir a vegetação de suas fazendas. O PSL acabou sendo concedido pelo então presidente do TJMS Divoncir Schreiner Maran.
O decreto desta quarta-feira do governador Eduardo Riedel, embora suspenda todos os pedidos em andamento para suprimir vegetação em fazendas do Pantanal, não alcança pedidos já realizados e efetivados.
O Correio do Estado perguntou à assessoria do Imasul se licenças judicializadas, como é o caso das concedidas para essas duas fazendas, seriam alcançadas pelo novo decreto, mas não houve resposta até o fechamento desta edição.
Monitoramento do MapBiomas indicou que, só no primeiro semestre deste ano, 25.543,1 ha foram suprimidos, o que representa aumento de 175% na comparação com os 9,3 mil ha desmatados no mesmo período de 2022.
30.000 hectares de supressão vegetal
O Imasul autorizou, no fim da década passada, a Fazenda Santa Mônica a suprimir 20 mil ha de vegetação nativa e a Fazenda São Sebastião a desmatar outros 10 mil ha.
25,5 mil hectares desmatados
Só no primeiro semestre deste ano, o MapBiomas constatou o desmatamento de 25,5 mil ha de vegetação nativa.